Plinio Corrêa de Oliveira
Recolhimento, silêncio, isolamento foram, em todos os tempos, notas distintivas dos religiosos cartuxos, da Ordem fundada por São Bruno, no século XII.
O homem de nossos dias, em contacto com os cartuxos, tê-los-ia em conta de almas anquilosadas, sem estímulo nem vitalidade ou qualquer forma de dinamismo.
Ora, duas esplêndidas realizações desses religiosos, até fortemente contrastantes, embora harmônicas, desmentem essa falsa impressão: são eles os criadores do internacionalmente renomado licor Chartreuse e dos esplendorosos e não menos renomados cavalos cartusianos. Um magnífico exemplar dessa raça, o leitor pode contemplar nesta página.
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Sob o céu da Andaluzia (Espanha), esvoaçando sobre o campo raso e aberto de uma alegre manhã ensolarada, um cavaleiro radiante de vitória e de glória realiza uma das mais belas e expressivas manifestações da coragem humana: a força de ousar e de avançar.
Há uma inegável beleza em se contemplar um homem que flutua sobre as incertezas dos mares rumo a um destino distante. Mas não se pode negar beleza a este nosso cavaleiro, que parece navegar pelos ares em circunstâncias que o avantajam em relação a qualquer piloto de avião: ele não pilota uma máquina, mas um ser vivo, cuja vitalidade e mutabilidade são superiormente governadas por ele. É admirável a força com que o cavalo, tão bem conduzido, conseguiu vencer a atração da gravidade e se elevou no ar.
Percebe-se ademais uma espécie de domínio psicológico do cavaleiro em relação ao cavalo, de maneira que a ousadia daquele se reflete neste como num espelho. É uma só ousadia, um só élan em um só vôo!
A luz que se reflete sobre o cavalo – de modo a lhe realçar a musculatura e a força do corpo, o que faz dele uma espécie de aeronave viva fendendo os ares – nenhum artista poderia tê-la imaginado tão bela.
Contribui possantemente para a perfeição da cena, o movimento do tecido que o cavaleiro traz ao pescoço. O vento levanta essa echarpe como o cavaleiro o cavalo. E há nesse tecido uma como que palpitação imponderável da vitória e da glória alcançadas pelo cavaleiro no completo domínio da situação.

Também a crina do animal, que esvoaça ao vento, é de uma beleza que se diria pictórica e perfeita. Assemelha-se a uma labareda escultural, entretanto cheia de movimento. O olhar do cavalo parece devorar o perigo; e sua boca mastigar o risco. Contudo, ele avança confiante no domínio de quem o guia, e suas patas dianteiras esboçam até elegante repouso. Há nele um equilíbrio nervoso, uma flexibilidade e uma obediência perfeitas.
Estamos em presença, propriamente, de uma bela expressão de autêntico heroísmo humano, o qual não consiste tanto no poder de destruir, quanto em enfrentar o risco. Tal noção, o homem pragmático, securitário e tantas vezes vil de nossos dias a perdeu de modo quase completo, senão inteiramente. Que a esplendorosa cena nos sirva de lição, e de exemplo!
Revista CATOLICISMO – Abril de 1991