Nobreza e elites tradicionais análogas
por Murillo Galliez
Atribui-se a Winston Churchill, o eminente estadista inglês, uma apreciação, densa de conseqüências, sobre a França. Teria dito ele que, mais do que em qualquer outro país, nota-se ali uma divisão entre duas partes, produzida por um verdadeiro rio de sangue, nascido da Revolução Francesa.
Muitos poderiam duvidar da objetividade dessa apreciação, julgando-a exagerada. Mas a autoridade de Churchill, enquanto político e enquanto historiador, a genialidade que imprimiu aos seus ditos mais famosos e às suas observações mais sagazes, não deixam margem para se tomar como exagero esta sua opinião sobre a França.
Quando se considera o resultado da pesquisa de opinião efetuada há pouco tempo naquele país sobre a condenação de Luís XVI e de Maria Antonieta, absolvendo os Soberanos, bem como os recentes conflitos ocorridos na praça denominada paradoxalmente “da Concórdia”, em Paris, por ocasião do bicentenário da morte daquele Rei (ver Catolicismo, abril/93), constata-se que as palavras do renomado político britânico foram significativamente confirmadas pelos fatos.
E provável, entretanto, que tal afirmação de Churchill não seja igualmente objetiva no tocante a todas as regiões da França; em algumas a realidade poderá estar aquém, em outras estará além da mencionada descrição. Mas, de qualquer modo, é inegável que existe um desacordo forte, profundo e –– pode-se até dizer –– quase perene entre as duas Franças a propósito doAncienRégime, da Revolução Francesa e da restauração monárquica dos Bourbons (1815–1830).
Seria um erro pensar que tal debate, que divide a França, se reduz a um desacordo sobre as pessoas de Luís XVI e de sua esposa, ou sobre a política seguida por ele enquanto monarca absoluto (1774-1789) e como soberano constitucional (1789–1792).

A entronização da "deusa" Razão no altar-mór da Catedral de Notre-Dame em Paris deu-se a10 de novembro de 1793
O desacordo é causado também por outros problemas intimamente entrelaçados com esses, tais como: a crise religiosa provocada pela Constituição Civil do Clero, a entronização da “deusa” Razão na Catedral de Notre-Dame, a perseguição contra os padres refratários às inovações revolucionárias, o aprisionamento do Papa Pio VI, em 1798, e sua morte conseqüente, em 1799. Além desses problemas de cunho religioso, houve também, no que diz respeito à ordem temporal, a supressão da nobreza e dos títulos nobiliárquicos, a abolição dos privilégios feudais, etc.
Esses três grupos de problemas estão vinculados entre si por vários aspectos. Entre estes, é de especial importância o mito revolucionário nascido da “filosofia das luzes”, isto é, o mito da igualdade completa. Cumpre, pois, examiná-lo com mais cuidado.
O mito igualitário
Em sua maior radicalidade, tal mito não consiste em atenuar esta ou aquela desigualdade, mas em eliminá-las todas, já e para sempre. Nenhum campo da atividade humana poderia escapar a esse nivelamento absoluto e geral: nem o religioso, nem o político, nem o social e econômico. Até os campanários e as árvores particularmente altas deveriam ser derrubados, enquanto os vales seriam preenchidos pela terra tirada às montanhas, conforme se cogitou durante o governo do terrível Comité de Salut Publique.
No campo político, no decorrer da Revolução Francesa, o mito igualitário mostrou-se moderado nas fases iniciais da mesma. Os feuillants, por exemplo, eram monarquistas moderados. Foram seguidos pelos girondinos –– já republicanos, mas moderados –– e pelos jacobinos, bastante radicais. Na fase final daquela Revolução, o igualitarismo afirmou-se como uma posição exacerbada, até chegar aos extremismos comunistas de Babeuf.
O mito igualitário, porém, sente-se contundido pela existência de uma nobreza, porque esta constitui uma evidente desigualdade na estrutura social de um país. Ainda mais contundente para o mito igualitário é a nobreza hereditária, ou seja, uma desigualdade social que se transmite de geração em geração, apontada pela Revolução como gratuita e, em conseqüência, provocativa.
Assim, que um herói de guerra se torne nobre é um fato que certos igualitários moderados toleram. Mas que um homem, que não foi herói de guerra, herde o título de um herói, constitui para tais igualitários uma desigualdade sem fundamento e, por isso, particularmente provocativa.
Transpondo o mesmo igualitarismo do campo social para o econômico, os comunistas moderados viram algo de justo no maior salário de um trabalhador que trabalha mais. Porém, que o filho dele pudesse herdar o seu ganho, também pareceria a eles um fato provocativamente contrário à igualdade.
Atualmente a exasperação do igualitarismo se manifesta em certas correntes ecológicas extremadas, que chegam a negar ao homem o direito de utilizar-se dos animais para a sua própria alimentação. Um vegetarianismo baseado em princípios filosóficos igualitários seria um exemplo disso.
Pressuposto: as alocuções de Pio XII
Contra tal igualitarismo revolucionário, especialmente em seu aspecto social, o pranteado Papa Pio XII pronunciou, ao longo de seu pontificado, uma série de alocuções dirigidas ao Patriciado e à Nobreza romana, por ocasião dos cumprimentos que os nobres apresentavam ao Pontífice, no início de cada ano. Tais alocuções constituem uma esplêndida coletânea de 14 documentos (elas foram pronunciadas nos anos de 1940 a 1952, e depois em 1958), nos quais aquele Pontífice chama especialmente a atenção de Seu auditório para os seguinte!pontos:
–– a legitimidade da existência da nobreza em nossos dias, pelo menos enquanto classe social, mesmo em regimes republicanos e democráticos;
–– a nobreza enquanto depositária das verdadeiras tradições e artífice do verdadeiro progresso;
–– o papel da nobreza como classe dirigente da sociedade, o dever dos nobres de não se esquivarem dessa missão e as qualidades que devem ter para bem cumpri-la;
–– a existência de elites tradicionais análogas à nobreza que imprimem um tônus aristocrático à sociedade, mesmo em países de regime republicano e democrático.
Não se pode alegar que os ensinamentos de Pio XII perderam sua validade doutrinária com a realização do Concílio Vaticano II. Pois Paulo VI, em pleno período conciliar, reafirmou a validade e a atualidade daqueles ensinamentos, em alocução dirigida ao Patriciado e à Nobreza romana, em janeiro de 1964.
Visão geral do novo livro
Ora, uma das características próprias às diversas TFPs, presentes em mais de vinte países nos cinco continentes, é o combate ao erro do igualitarismo, talvez o mais nocivo de nossa época, na qual já proliferam tantos erros.
É fácil compreender, portanto, que o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, fundador da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, e presidente vitalício de seu Conselho Nacional, tenha escrito a obra “Nobreza e elites tradicionais análogas nas alocuções de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza romana”, na qual analisa e comenta as referidas alocuções, realçando especialmente seu combate ao igualitarismo social que vinha no bojo das repúblicas revolucionárias. O livro acaba de vir a lume em Lisboa, lançado pela prestigiosa Editora Civilização.
Em linhas gerais, a obra contém sete capítulos e quatro apêndices, acrescida de doze seções de documentos que confirmam as teses nela defendidas. Nesses documentos, estão incluídos os textos integrais das alocuções de Pio XII, que são o principal objeto dos comentários do Autor.
Como o título da obra indica, sua principal tese pode dividir-se em duas partes:
–– afirmar a legitimidade da existência da nobreza tradicional, titulada, cujas origens remontam geralmente à época da constituição do regime feudal, durante a Idade Média;
–– afinnar também a existência de outras elites, de origens diversas da nobreza tradicional, mas que, pela continuidade de suas linhagens familiares ao longo das gerações e pelo serviço que prestam ao país no campo cultural, econômico ou administrativo, podem ser consideradas como elites análogas à nobreza.
Estão neste caso as elites rurais ou urbanas, constituídas por grandes proprietários e por figuras de relevo no mundo do comércio, da indústria, da cultura, das finanças, da administração, das forças armadas.
A presença da nobreza e de tais elites análogas confere uma nota especificamente anti-igualitária a uma sociedade bem constituída e hierarquicamente estruturada.
Portanto, no combate ao igualitarismo, parece ser um ponto de capital importância defender a existência da nobreza e de tais elites.
Torna-se assim mais explicável por que o Autor –– paladino incansável e inigualável na luta sem tréguas contra a Revolução gnóstica e igualitária (ver seu livro “Revolução e Contra-Revolução”) ––tenha julgado mais eficaz para esse combate escrever uma obra em defesa da nobreza e das elites tradicionais, do que uma obra em favor apenas da monarquia. Pois historicamente está provado que à Revolução custa mais demolir uma sociedade pujantemente hierárquica, do que simplesmente derrubar um trono.
Os três primeiros capítulos: alcance das alocuções de Pio XII
Nos primeiros capítulos da obra, antes de entrar propriamente na análise e nos comentários das alocuções de Pio XII, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira prepara o leitor para compreeender melhor o sentido , a importância e o alcance daquelas alocuções.
No capítulo I, após explicar o conceito de nobreza e de elites tradicionais, ele desfaz objeções que poderiam ser levantadas contra a atualidade e a objetividade daqueles ensinamentos, salientando sua utilidade como escudo contra os inimigos da nobreza.

Livio Odescalchi - nobre italiano e pai do Papa Inocente XI - o papa da Santa Aliança que levantou o cerco de Viena de 1683
No capítulo II, há um breve histórico da situação da nobreza italiana –– e mais particularmente da nobreza romana –– nos séculos XIX e XX, até a época de Pio XII, quando a Itália passou de monarquia a república. Em seguida, o Prof. Plinio Corrêaa de Oliveira mostra como as alocuções de Pio XII, embora dirigidas diretamente aos nobres romanos, têm na realidade um alcance universal, pois seus ensinamentos podem ser aplicados às nobrezas de todos os países, e até mesmo às elites de países sem passado monárquico.
O Capítulo III trata de questões básicas da doutrina social da Igreja, tais como: a legitimidade e a necessidade das desigualdades sociais, o conceito de povo e massa, de liberdade e igualdade, de verdadeira e falsa democracia. Para isso, o autor lança mão de outro documento de Pio XII, sua famosa radiomensagem de Natal de 1944, em que o Pontífice trata especificamente desses temas.
Capítulos IV a VI: comentários das alocuções
Nos capítulos IV, V e VI o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira passa a comentar então os ensinamentos de Pio XII contidos nas alocuções ao Patriciado e à Nobreza romana a respeito da missão específica da nobreza em nossos dias.
O Capítulo IV mostra como, antes de tudo, a nobreza deve continuar a existir, fazendo parte da classe dirigente da sociedade, apesar de todas as transformações políticas, sociais e econôlrucas ocorridas nos últimos tempos.
O Capítulo V é dedicado ao comentário do ensinamento de Pio XII sobre a existência das elites tradicionais como guardiãs da tradição e propulsoras do verdadeiro progresso.
Um dos itens deste mesmo capítulo trata especificamente de um tema que será desenvolvido mais extensamente no Apêndice III da obra: é a questão das formas de governo e o conceito de democracia segundo a doutrina social da Igreja.
O Autor conclui, com Pio XII, pela normalidade da existência da nobreza e das elites tradicionais numa verdadeira democracia.
No Capítulo VI, o Prol’. Plinio Corrêa de Oliveira comenta os ensinamentos de Pio XII a respeito das qualidades de alma que a nobreza deve ter nos dias atuais. E como tais qualidades devem ser colocadas a serviço do bem comum, através da missão específica da nobreza de ser guia e dirigente da sociedade.
De posse dessas qualidades, a nobreza e as elites tradicionais não podem eximir-se de sua responsabilidade de serem guias e dirigentes da sociedade. Neste sentido, o absenteísmo e a omissão constituem para elas um pecado; a ausência dos guias torna-se uma virtual cumplicidade com o mal.
Porém, não é só pela ausência e pela omissão que a nobreza e as elites tradicionais deixam de cumprir o seu dever. Elas “também podem pecar contra a sua missão deixando-se deteriorar pela impiedade e pela imoralidade”, tal como aconteceu com a alta sociedade francesa do século XVIII e como sucede no presente com certos elementos da aristocracia.
Capítulo VII: considerações amplas sobre a nobreza e elites análogas
Afastando-se agora dos comentários mais estritos e detalhados das alocuções de Pio XII, que constituem o conteúdo dos capítulos anteriores, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, no Capítulo VII de sua obra, estende-se em considerações mais amplas sobre a nobreza e as elites análogas: sua gênese, a linha geral de sua história, suas características próprias e, muito especialmente, sua missão na sociedade hodierna.
Após uma substanciosa referência à relação entre a esfera privada e o setor público, e acerca da prevalência do bem comum sobre o bem individual, ele descreve o papel da família na sociedade, sua relação com os grupos intermediários e com o Estado, e como ela se tornou a fonte das linhagens que deram origem às elites.

Egas Moniz, com sua família, redime sua honra diante do Rei Afonso VII de Leão e Castela . Azulejo de Jorge Colaço
Passa então a relatar as origens históricas da nobreza feudal, a gênese do feudalismo: com o desmoro-namento do Império carolíngeo devido às invasões dos bárbaros, verificou-se a reestruturação da sociedade, a partir dos pequenos feudos que se formaram para resistir aos ataques dos invasores; à medida que o perigo foi diminuindo, uma hierarquia feudal se foi estruturando, subordinada ao rei que, no período medieval, constituía o ápice de uma pirâmide de senhores feudais.
O Autor mostra em seguida como a nobreza assim formada, tanto em sua existência concreta como em seus princípios doutrinários, resultou de um processo consuetudinário, de uma interação modeladora, da qual participaram os mais diversos setores da escala social.
Nos itens seguintes é descrita sucintamente, do ponto de vista histórico e social, com o advento da monarquia absoluta, a progressiva destruição dessa sociedade orgânica e a liquidação da nobreza enquanto elemento participativo do poder real. São apresentados exemplos históricos dessa hipertrofia do poder real em alguns países.
Essa evolução no sentido da centralização do poder deu origem ao Estado contemporâneo, em que o absolutismo real se transformou em absolutismo de Estado sob o regime democrático-representativo. À centralização do poder político seguiu-se a centralização do poder econômico, com sua expressão mais radical no capitalismo de Estado do regime comunista.
Tal processo representou a destruição de tudo o que restava das antigas características da nobreza numa sociedade orgânica.
Para que se possa compreender como deve ser a nobreza, que qualidades deve ter para cumprir integralmente sua missão, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira passa a descrever então aquilo que ele considera corno um dos mais importantes traços da nobreza: o tipo humano do nobre, tomando por modelo o perfil moral do nobre medieval.
“Dois princípios essenciais definiam a fisionomia do nobre:
“1. Para ser o homem modelar posto no píncaro do feudo como a luz no lampadário, tinha ele de ser, por definição, um herói cristão disposto a todos os holocaustos a favor do bem de seu rei e de seu povo, e o braço temporal armado em defesa da Fé e da Cristandade, na guerra freqüente contra pagãos e hereges.

O nobre precisava ser "um herói cristão disposto a todos os holocaustos a favor do bem de seu rei e de seu povo". Dona Filipa de Vilhena arma e manda os filhos ao combate na Restauração.
“2. Mas, para isso, ele, como toda sua família, tinha de dar em tudo o mais um bom exemplo –– ou melhor, um exemplo ótimo –– a seus subordinados e seus pares. Na virtude, como na cultura, no trato social exímio, no fino bom gosto, na decoração do lar, nos festejos, o seu exemplo deveria impulsionar todo o corpo social a fim de que cada qual, analogamente, melhorasse em tudo” (Cap. VII, 7, a).
Também a nobreza em nossos dias, para cumprir adequadamente sua missão, deve possuir essas qualidades. Ela deve ser padrão de excelência e impulso para todas as formas de elevação e de perfeição.
Após a transcrição de substanciosos trechos de uma alocução de Bento XV ao Patriciado e à Nobreza romana, em que aquele Pontífice faz alusão a um “sacerdócio” da nobreza, o Autor passa a tratar, no último item do capítulo, do florescimento de elites análogas como formas contemporâneas de nobreza, embora reconhecendo que, a tais formas “contemporaneizadas”, os Pontífices não chegaram a referir.
Apresenta então exemplos históricos de formas de nobilitação. Elas vieram dar origem a tipos de nobreza que, embora autênticos, eram diferentes e de brilho menor que a antiga nobreza tradicional. Tal era, por exemplo, a nobreza de ocupantes de cargos na magistratura, no magistério universitário, na administração pública e nas forças armadas, e também aquelas linhagens de origem comercial ou industrial que haviam prestado relevantes serviços ao bem comum.
Com base em tais precedentes históricos, o Autor sugere então a criação de novos degraus hierárquicos –– para as novas modalidades de nobreza –– na escala social.
E, ao terminar o capítulo, o Autor declara que tais cogitações, suscitadas pelo estudo atento das alocuções de Pio XII, exprimem esperanças de que o caminho traçado por aquele Pontífice não seja esquecido ou subestimado pela nobreza e pelas elites análogas existentes em todo o mundo.
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Na conclusão, após substanciosos comentários sobre a situação caótica da política internacional em nossos dias, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira renova suas esperanças, fundamentadas na promessa de Nossa Senhora em Fátima: “Por fim, o meu lmaculado Coração triunfará”.
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Aristocracia no Brasil; doutrina católica sobre formas de Governo
Haveria uma lacuna na resenha sobre o livro Nobreza e elites tradicionais análogas nas alocuções de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza romana se nela não se fizesse menção, ainda que sumária, de dois dos apêndices da obra, os quais, pela importância do tema tratado, poderiam até figurar como publicações independentes.
Formação da aristocracia brasileira
O primeiro deles é o Apêndice I, intitulado No Brasil Colônia, no Brasil Império e no Brasil República: gênese, desenvolvimento e ocaso da ‘Nobreza da terra’ –– O papel da incorporação de elementos análogos à nobreza originária.
Trata-se de um estudo de caráter histórico e sociológico, apoiado em citações de numerosos e conhecidos autores, mostrando como se formou no Brasil uma aristocracia nativa, a partir de seus primeiros colonizadores e povoadores. E que papel teve essa elite na sociedade, no curso das diversas fases da história de nosso país.
Monarquia: em tese, melhor forma de Governo
O outro é o Apêndice III, intitulado As formas de governo à luz da Doutrina Social da Igreja: em tese –– in concreto.
Nele são citados documentos pontifícios e textos de Santo Tomás de Aquino a respeito das formas de governo. Ao comentá-los, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira mostra como a liberdade de opção entre os três regimes –– monárquico, aristocrático ou democrático –– deve estar fundamentada apenas nas circunstâncias concretas, próprias a cada país, mas não em pressupostos ideológicos ou doutrinários.
Pois, como ensina Santo Tomás, em tese –– ou seja, segundo os princípios abstratos –– a monarquia é sempre a melhor forma de governo; mas nem sempre é aplicável às condições concretas de cada país.
Assim, um fiel poderia escolher a forma republicana-democrática para seu país, mas somente quando ela fosse a melhor, em vista das circunstâncias concretas próprias àquele país. Porém, não poderia escolhê-la por motivos ideológicos e doutrinários, como, por exemplo, pelo fato de ela ser um regime mais igualitário que a monarquia. Pois um católico, ainda quando levado, por circunstâncias concretas, a preferir uma república democrática para sua pátria, deveria desejar que tais circunstâncias mudassem, a fim de que seu país pudesse ter a forma de governo que, em tese, é a melhor: a monarquia.
Por fim, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira apresenta o exemplo da implantação da república revolucionária na França –– fruto da Revolução Francesa e de outras revoluções ocorridas naquele país durante o século XIX ––, realizada por motivos evidentemente ideológicos e doutrinários. Tal república pretendeu, no decurso do século passado, ser aceita pelos católicos a pretexto de que as condições concretas da França a tornavam necessária ao país. A falsidade desse pretexto, o caráter nitidamente revolucionário e anticatólico do regime, e a penetração das idéias liberais entre os católicos, produziram uma profunda divisão nas fileiras católicas que, em boa medida, perdura até hoje.