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Mimetismo brasileiro favoreceu a Proclamação da República

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Primeira bandeira dos Estados Unidos do Brasil (15-19 de novembro de 1889)

 

É explicável que alguns brasileiros, de espírito simplista, queiram por força ver, nas vantagens que nos levam os Estados Unidos em prosperidade, um efeito, não de causas naturais e irremediáveis, mas uma resultante da diferença de governos. O solo não se pode trocar, a raça não se pode substituir, mas, em todo o tempo, é possível mudar o governo. Não podendo dar-nos o solo dos Estados Unidos, nem as qualidades étnicas do seu povo, houve quem quisesse dar-nos aos menos o seu governo, isto é, o que de menos invejável tem a grande nação.

E a escola fatal dos imitadores de instituições não atende ao contra-senso do seu sistema, nem aos funestos resultados que produzem as leis transplantadas arbitrariamente de um país para outro. Quando os romanos ainda rudes conquistaram a culta Grande Grécia, Valério Messala trouxe de Catania um relógio solar que mandou colocar no Fórum, junto aos Rostros. Não atendeu Valério Messala nem à diferença de longitude nem à orientação do gnomo, e dispo-lo ao acaso. Só um século mais tarde é que se descobriu em Roma que o relógio solar marcava a hora com grande erro de tempo, e só então é que foi substituído. O relógio que dava o tempo certo em Catânia errava em Roma (*). Assim as instituições: podem dar certo nos seus países de origem, e trazer a confusão e a desordem nos países para onde arbitrariamente as transmudam.

No Brasil aconteceu o mesmo com a idéia funestíssima de copiar os Estados Unidos nas suas leis políticas. Copiemos, copiemos, pensaram os insensatos, copiemos e seremos grandes! Deveríamos antes dizer: Sejamos nós mesmos, sejamos o que somos, e só assim seremos alguma cousa. Imagine-se um indivíduo qualquer que, admirando uma tela de Velásquez, deseje pintar como ele. De que servirá ter a tela, os pincéis, a palheta e as tintas perfeitamente iguais, em matéria-prima, tamanho e dosagem às do pintor espanhol? Debalde arranjará as tintas e esforçar-se-á para pintar como Velásquez. Terá tudo quanto tinha Velásquez, menos o gênio, e mesmo tendo gênio, será outro gênio e não o gênio de Velásquez. Assim, os países sul americanos querem ser ricos e prósperos como os Estados Unidos, e pensam que conseguirão isto copiando artigos da constituição norte americana. E como é muito da natureza humana imitar mais facilmente os vícios do que as virtudes, a imitação das práticas corruptas da administração americana é cousa muito natural. “Nos Estados Unidos rouba-se muito”, pensa o empregado público sul americano, “e, apesar disso, são um grande país; ora, por que não será grande o meu país, apesar de eu roubar e dos meus colegas roubarem?” Esse raciocínio apresenta-se forçosamente à fragilidade do funcionário, a tentação fortalece-se e… o resto temos visto. (…) Os vícios dos grandes corrompem os pequenos, e o mau exemplo dos poderosos é a perdição dos humildes.

(*)Plinio, Hist. Nat., liv. VII,60.

(A ILUSÃO AMERICANA – Eduardo Prado)

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