Havia apenas um mez que, na Real Capella das Necessidades, se celebrára o casamento da Infanta D. Maria Anna com S.A.R. o Príncipe Jorge da Saxonia, confirmando-se assim à face de Deus os contractos que os plenipotenciários tinham tratado e assignado: o Marquez de Loulé, pelo Rei de Portugal, e o Conde Carlos Frederico Vitzhun de Eckstaedt, pelo Rei da Saxonia.

Fôra D. Luiz, então, simples capitão de mar e guerra, buscar a bordo do seu navio o noivo, e foi também D. Luiz, quem depois do primeiro mez de lua de mel gozado no Paço de Belém, os levou no seu navio a Antuerpia.
Maio ouvira os sinos da capital tocar festivamente para as bodas da linda Infanta, vira passar os nubentes, nos coches graves, após a bênção do Patriarcha, fôra testemunha d’alegrias.
Julho ouvira tocar os sinos de Lisboa, mas a finados.
Em maio de 1859 casára uma Infanta; em julho, morria a Rainha, a bem amada Rainha Estephania.
A Rainha acompanhava muitas vezes S. M. o Senhor D. Pedro nas visitas aos enfermos da epidemia. Mas não foi nessas visitas que Ella encontrou a morte. Tinham ido a Vendas Novas. Lembro-me que a locomotiva foi toda enfeitada a dhalias. A Rainha Estephania contrahiu n’essa viagem uma angina diphterica; não lha conhecem, e em 24 horas morre.
Morreu no dia do Anjo Custodio do Reino. Havia uma prophecia popular que dizia que no anno em que a festa do Anjo Custodio cahisse a 17 de julho, haveria lucto nas testas coroadas. O dia do Anjo Custodio, que é no 3.o domingo de julho, nesse anno de 1859, cahiu a 17 de julho.
A Rainha Estephania conheceu a morte. Quando a Imperatriz se chegou ao leito d’ella, a Rainha disse-lhe:
– – “Os mosquitos já não acham o sangue tão doce!”
Ao expirar, deu estas palavras para a Imperatriz:
— “Peço à Avó que mande dizer aos meus Paes, que os dias mais felizes de minha vida os passei em Portugal”.
E o seu ultimo alento foi para pedir:
— “Consolem o meu Pedro!…”
D. Pedro V queixava-se, entre os soluços da sua dôr:
— “Nunca tenho uma alegria completa. Há um mez uns noivos que me fizeram bem, e já agora a morte!…”
Tinham-se partido, uma vestida de noiva, outra amortalhada pela saudade do esposo e do povo português, as companheiras inseparaveis de D. Pedro V nos seus longos passeios pelos casebres e campos cumvizinhos do Paço.
À consciência da sua missão de Rei e no revolvêr da propria dôr, ia D. Pedro V buscar as forças para se resignar da crueldade do destino que mal lhe déra quatorze mezes para ser noivo e viuvo.
À fé religiosa ia o Príncipe Hohenzollern buscar, e encontrar a conformação perante a perda da filha.
É d’um catholico a seguinte carta do Príncipe Hohenzollern, escripta em resposta e agradecimento aos pezames que a S.A.R. escreveu o Conde da Ponte.
“Vossa Excellencia
quiz exprimir-me a sua co-participação na dôr pela perda cruel, que a Providência divina nos impôz. Abençoando a Sua vontade, devemos crêr que, dilacerando nosso coração, rasgando laços de família, dos mais queridos, mergulhando-nos no mais profundo lucto, Ella nos quiz experimentar.
Agradecemos a Vossa Excellencia o ter-nos associado ao nosso desgosto. Mas creia que também, posso dizer-lh’o sem vaidade, perdeu uma alma nobre e bondosa, que lhe foi muito affeiçoada e reconhecida pessoalmente -. porque a minha muito amada filha não se cançava de me dizer quanto apreciava a sua dedicação e os seus serviços.
Chorêmo-la sinceramente, que, emquanto nós a choramos, Ella rogará por nós lá nas Alturas, e será o nosso anjo guardião commum.
Aceite a expressão do meu vivo reconhecimento por toda a dedicação que mostrou e testemunhou à minha fallecida filha, e creia, senhor Conde, nos sentimentos d’alta estima que continua a votar-lhe.
O seu
dedicado
Principe de Hohenzollern
Dusseldorf 4 – agosto -59
(LEITÃO, Joaquim – AS ALLIANÇAS DAS CASAS DE BRAGANÇA E HOHENZOLLERN – Porto, 1913)
[conservada a grafia original]